Thursday, January 29, 2009

Por água abaixo



Segundo o último relatório do Banco Mundial, a China precisa reformular e reforçar a gestão de seus recursos hídricos.
A pesquisa sugere atenção especial em relação a transparência das regras nas relações entre governo, mercado e sociedade, melhorias quanto a eficiência e a eficácia da gestão das instituições hídricas, regulamentação dos preços para mecanismos de compensação ecológica, e o reforço da aplicação e controle da poluição hídrica bem como a conscientização e a preparação para emergências causadas pela poluição da água.

O anúncio não é exatamente uma novidade, de novo concentra-se a mobilização do governo chinês pela causa.
Em notícia divulgada no início desta semana, a mídia estatal publicou o plano do governo que deve contemplar 60 milhões de pessoas em 2009 com o fornecimento de água "limpa".
No mundo das sutilezas chinesas não ficou claro para mim se a menção diz respeito a água potável ou água não contaminada. Já que 5.464 quilômetros por onde percorrem as águas do berço da civilização chinesa, o rio Amarelo, responsável pelo abastecimento de mais de 155 milhões de pessoas e 15% das plantações, o nível de poluição das águas é de 66%.
Ou seja, mais de 200 milhões de chineses não tem acesso a água potável, número bastante inferior se comparado a conjuntura de 9 anos atrás onde o país registrava 379 milhões de pessoas.

O grande vilão deste cenário de devastação e poluição é atribuído ao rápido crescimento econômico.
E a grande surpresa provocada pelas propostas do Banco Mundial diz respeito ao apelo do organismo internacional frente ao governo chinês para que aumente o preço da água como medida para inibir o consumo e promover maior eficiência na tentativa de evitar uma grave crise provocada pela escassez da água.

Surpresa porque me parece demasiado simplista e pouco includente propor aumento no preço da água num cenário onde mais de 200 milhões de chineses nem acesso a mesma ainda tiveram.
Programas de conscientização, que esclareçam a gravidade do tema, e o aumento do preço das tarifas de água de acordo com a renda per capita das províncias me parece mais razoável.

E de repente me ocorre a perspectiva surreal de me deparar daqui uns anos com um relatório do Banco Mundial que em ação conjunta com a Organização Mundial da Saúde incitariam em tom apelativo a mobilização do governo chinês para tratar dos problemas acarretados pelo aumento excessivo do índice de alcólatras no país, a maior incidência de casos de cirrose hepática, arritmias, trombose, síndrome amnética.
Em tom solene anunciariam campanha para reverter as sugerências propostas outrora frente ao aumento do preço da água. Pois não lhes era de conhecimento na ocasião que o *preço da cevada maltada mais famosa no território, a tsingtao, já era mais em conta que o da garrafa de água mineral.
O batismo da campanha seguiria os moldes tradicionais fazendo o uso da água, que nesta altura do campeonato seriam literalmente água santa.
"Por água abaixo!" gritariam autoridades e espectadores saudando e aplaudindo o nome e lema da então campanha.


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::Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor informa::

O preço praticado nos estabelecimentos comerciais chineses para os seguintes itens:

-Garrafa 600 ml cerveja tsingtao: 2,5rmb
-Garrafa 600 ml cerveja yanjing: 2,5 rmb
-Garrafa 300 ml água wahaha: 2,40 rmb
-Garrafa 300 ml água nestlé: 3,20rmb

*Obs: No ato de devolução do vasilhame das cervejas exija seus 0,5 rmb por unidade.

Wednesday, January 28, 2009

Plié, balancé, brisé - Ou o ballet contemporâneo das relações franco-chinesas


Ontem, apesar da ocasião, a celebração do 45º aniversário da reconciliação diplomática entre França e China (após o rompimento provocado pela Revolução Comunista de Mao Tsé-tung), não houve muita festa, nem motivos aparentes para brindes con Don Perignon.

Oui, oui, o primeiro-ministro chinês Wen Jiabao em visita oficial por cinco países da Europa -a primeira após a crise diplomática com a França que concatenou o cancelamento da Cúpula União Europeia-China, não fará escala em Paris.
Por questões de ressentimentos e desaprovação em relação aos posicionamentos franceses.
São eles: as manifestações pró-Tibet durante a passagem da tocha olímpica pela França. O eventual boicote do presidente francês Sarkozy à cerimônia de abertura dos jogos olimpícos. E mais recentemente, pelo encontro realizado no início de dezembro entre Sarkozy e Dalai Lama, líder espiritual do Tibet- região autônoma chinesa que reivindica independência.

O balancé das relações bilaterais entre China e França, voltou ao plié e deve continuar assim flexionado até que Paris dê o primeiro passo de reaproximação, segundo declarações do ministro-adjunto de Relações Exteriores da China, Wu Hongbo.
Oficiais da chancelaria francesa tentam conciliar a situação sugerindo o diálogo entre as partes, sem causar qualquer reação em Pequim.

O ballet político contemporâneo das relações franco-chinesas, encantava pela harmonia dos movimentos. Que deram mostras da fragilidade da dança no segundo semestre de 2008 justamente em virtude dos três episódios traumáticos, que desencadearam por todo o território chinês manifestações ultra-nacionalistas e campanhas de apoio ao país com emblemas do gênero: I love China, ou o mais difundido 中国加油! ( Viva China!).
Os brios do nacionalismo ferido fomentaram ainda campanhas de boicotes aos produtos e marcas francesas.
Bernard Arnault, executivo da marca LVMH detentora entre outras do Carrefour e Louis Vuitton, declarou na ocasião a síntese entre o pensamento e a conduta a serem aplicados por aqui: "China needs time" ( China precisa de tempo).


O tempo para o tão esperado brisé, deve acontecer somente no dia 03 de abril, data a ser realizada a Cúpula do D-20, onde a reforma dos mecanismos de regulação do sistema financeiro internacional poderá ser aprovada.
O maior defensor da reforma, Nicolas Sarkozy, não será consultado.
Wen Jiabao, em visita a Davos na Suíça participará do Fórum Econômico Mundial, que em função das consequências globais da crise financeira poderá ser a edição mais importante da história do Fórum.
O premiê seguirá então para Alemanha, Espanha, Grã-Bretanha e Bélgica.
Enquanto o ballet bilateral permanece em plié.

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Glossário do ballet::

Plié:: Literalmente joelhos flexionados.

Balancé:: Movimento de equilíbrio.

Brisé:: Saltos ou saltinhos no ar.